Era domingo. Clima de decisão. Daqueles dias em que não se joga apenas futebol — joga-se história. Em campo, uma vaga na final da Copa do Brasil. Fora dele, sentimentos acumulados, contas antigas e feridas abertas. O cenário estava montado: de um lado, o Cruzeiro, mesmo derrotado no Mineirão, chegava como favorito. Elenco forte, camisa pesada, confiança elevada após aplicar um 3 a 0 no Corinthians pelo Campeonato Brasileiro. Do outro, um Timão ferido, apenas 13º no Brasileirão, carregando mágoas da final de 2018 e um desejo quase obsessivo por mais uma taça.

O duelo tinha ainda um capítulo à parte: nos gols, nos gestos, nos símbolos. Arroyo, destaque celeste, protagonista no Brasileirão, provocador, em especial com Matheuzinho. E no gol, um confronto que doía no peito da Fiel: Cássio, lenda viva, ídolo eterno, agora do lado oposto. Do outro, Hugo Souza, recém-chegado, mas já moldando sua própria história com a camisa alvinegra.
O Cruzeiro começou como quem sabia exatamente o que precisava fazer. Jogou para frente, ocupou o campo ofensivo, pressionou. E aos 39 minutos do primeiro tempo, o roteiro começou a mudar. Christian cruzou da direita, Arroyo se antecipou a Matheuzinho e cabeceou forte, sem chances para Hugo Souza. O equatoriano havia acabado de entrar no lugar de Sinisterra — entrou e mudou o jogo. Um balde de água fria na Neo Química Arena.
Se o primeiro tempo já doeu, o segundo foi cruel. Logo aos quatro minutos, Kaio Jorge recebeu lançamento nas costas da zaga e rolou para Arroyo completar. O bandeirinha marcou impedimento, a torcida respirou… mas o VAR validou. 2 a 0 Cruzeiro. Silêncio. Medo. O que parecia controlável virou abismo.
Mas Corinthians não morre fácil. E foi ali, no meio do caos, que o jogo virou emocionalmente. Minutos depois, Rodrigo Garro cobrou falta, André Ramalho ajeitou para o meio da área e, em uma falha rara, Cássio não segurou. A bola sobrou limpa para Matheus Bidu completar de cabeça. O gol que reacendeu a Arena. O gol que mudou a atmosfera.
Empurrado pela Fiel, o Timão passou a encurralar o Cruzeiro. Garro obrigou Cássio a espalmar. Bidu tentou uma bicicleta e acertou o travessão. Breno Bidon carimbou a trave. O Cruzeiro não conseguia sair jogando. A pressão era total. A última chance do tempo normal ainda passou pelos pés de Garro, que bateu de primeira da entrada da área — para fora. Apito final. Pênaltis.

E aí veio o momento mais cruel e, ao mesmo tempo, mais simbólico da noite. O corintiano, já acostumado a sofrer, se perguntava: precisava sofrer tanto assim? Do outro lado, o cruzeirense confiava. Afinal, tinha Cássio. O goleiro que cresce em decisões. O rei das noites grandes.
Mas aquela noite seria diferente.
Quem começou melhor foi o Cruzeiro. Matheus Pereira converteu. Em seguida, Cássio defendeu a cobrança de Yuri Alberto. A Raposa abriu vantagem com gols de Wanderson, William e Lucas Silva. Do lado corintiano, Memphis Depay, Garro e Vitinho mantiveram o time vivo.
Veio então o pênalti que parecia definitivo. Gabigol tinha nos pés a classificação do Cruzeiro. Mas bateu mal. Hugo Souza defendeu. A Arena explodiu. Gustavo Henrique converteu na sequência e levou a disputa para as alternadas.
E ali, definitivamente, nasceu um novo capítulo. Wallace cobrou mal. Hugo Souza defendeu de novo. O antigo rei observava. O sucessor brilhava. Breno Bidon caminhou até a bola, bateu com frieza e selou a classificação.

Corinthians na final. Contra o Vasco.
Uma noite mágica. Sofrida. Do jeito que a Fiel conhece. Do jeito que só o Corinthians sabe ser. Mas, mais uma vez, fica a pergunta que ecoou na Arena até o último grito: precisa sofrer tanto assim?
Talvez sim. Porque é no sofrimento que o Corinthians se reconhece. E é nele que, muitas vezes, constrói suas maiores glórias.












